27 junho 2014

Nossos defeitos

Diante de uma vitrine atrativa, um menino pergunta o preço dos filhotes á venda.

-Entre  30 e 50 dólares, respondeu o dono da loja.

O menino puxou uns trocados do bolso e disse: -Eu só tenho tenho 2,37 dólares, mas eu posso ver os filhotes?

O dono da loja sorriu e chamou Lady, que veio correndo, seguida de cinco bolinhas de pelo.
Um dos cachorrinhos vinha mais atrás, mesmo mancando de forma visível.

Imediatamente o menino apontou aquele cachorrinho e perguntou: -O  que é que há com ele?
O dono da loja explicou que o veterinário tinha examinado e descoberto que ele tinha um problema na junta do quadril, sempre mancaria e andaria devagar. O menino se animou e disse: - Esse cachorrinho que eu quero comprar!

O dono da loja respondeu:

- Não, você não vai querer comprar esse. Se você realmente quiser ficar com ele, eu lhe dou de presente.
O menino ficou transtornado e, olhando bem na cara do dono da loja, com seu dedo apontando, disse:
-Eu não quero que você o dê para mim. Aquele cachorrinho vale tanto quanto qualquer um dos outros e eu vou pagar tudo. Na verdade, eu lhe dou 2,37 dólares agora e 50 centavos por mês, até completar o preço total.

O dono da loja contestou: - Você não pode querer realmente comprar este cachorrinho. Ele nunca vai poder correr, pular e brincar com você e com os outros cachorrinhos. Aí, o menino abaixou e puxou a perna esquerda da calça para cima, mostrando a sua perna com um aparelho para andar.

Olhou bem para o dono da loja e respondeu: - Bom, eu também não corro muito bem e o cachorrinho vai precisar de alguém que entenda isso.

Fonte : Livro Sabedoria em Parábolas


Viajar com bagagem leve


Dizem que os viajantes mais experientes levam malas menores, mais leves, mais fáceis de serem transportadas. São mais prudentes do que aqueles que levam malas pesadas, que aumentam as dificuldades. É um problema colocá-las no bagageiro ou mesmo andar pela cidade até o local em que se vai hospedar. 
A vida é, também, uma viagem. Igualmente, temos nossas bagagens que vão acumulando com o tempo.
Algumas pessoas acumulam tanto peso que vivem perturbadas. E, acostumadas com a perturbação, não conseguem se livrar. Não conseguem mais se lembrar do que é viver com leveza, com liberdade.
Há acúmulos materiais. Pessoas que não conseguem doar roupas, livros, CDs, móveis etc. E, como não param de comprar, suas casas ficam abarrotadas do que não usam, do que não necessitam. Em tempos de campanha do agasalho, faz muito bem experimentar a generosidade e ajudar quem precisa.
Há outras bagagens que pesam a nossa existência, com as quais, infelizmente, nos acostumamos e não conseguimos nos livrar. O peso do ódio, do espírito de vingança, da mesquinhez, da arrogância, da ausência de compaixão. O amor não correspondido. A traição. Os malfeitos que nos fizeram. Atos que, evidentemente, nos despertaram tristeza e dor. Mas há o tempo da dor, e o tempo de, dela, libertar-se. Há o tempo da tristeza e o da superação. E a viagem precisa seguir seu curso.
Acumular esses mesquinhos sentimentos é fazer com que nossa trajetória seja pesada, é correr o risco de não ter forças para prosseguir com dignidade, é cair com facilidade. Assim como acontece com as malas de viagem, as exageradas.
Acumular o que não se usa requer mais espaço e mais trabalho, além de gerar mais problemas. E é desnecessário. Acumular sentimentos menores é ainda pior. É fazer com que nossa vocação para a liberdade, para a leveza, seja comprometida com estranhamentos de ontem. Vivamos o hoje com os olhos para o amanhã. E com pouca bagagem. Ou melhor, com a bagagem essencial.

Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo) | Data: 27/6/2014

20 junho 2014

A cultura do encontro

Desde que o mundo conheceu o novo papa, somos todos – católicos ou não – surpreendidos por sua sabedoria e simplicidade. Francisco é um homem de palavras exatas. De reflexões singelas e provocativas. Ocupa-se, incansavelmente, de nos atentar para as evidências que, na velocidade da vida moderna, deixamos de enxergar, de ponderar.
Em sua rede social, com 14 milhões de seguidores, o papa nos chama para o cuidado com os idosos: "Às vezes descartamos os idosos, mas eles são um tesouro precioso: descartá-los, para além de ser injusto, é uma perda irreparável”. Alerta-nos contra a cultura do descartável. Da injustiça. Convoca-nos, enfim, à missão de paz e bem. “Fazei-me instrumento de Vossa paz”, como disse o outro Francisco, o santo de Assis. O revolucionário do Amor.
Apenas o amor pelo próximo nos faz enxergar a face de Deus. Descartar nosso irmão é desconhecer nossa essência. Somos carentes uns dos outros. Em qualquer idade. No caso dos idosos, há uma razão a mais: é desperdício não aprender com sua sabedoria e experiência. Os idosos, assim como os jovens, constroem a sociedade, sustentam-na, alimentam-na em sua fonte de conhecimento, de histórias, de continuidade da família, de vir-a-ser. Edifiquemos a cultura da inclusão, do encontro, do acolhimento.
Pesquisas revelam que a população mundial vem envelhecendo, e a pirâmide etária, antes triangular, tende a se transformar. As pessoas estão vivendo cada vez mais. Além disso, nota-se uma participação mais ativa dos idosos, seja na continuidade do trabalho ou do estudo, seja na contribuição orçamentária às famílias. É evidente a importância da mudança do estereótipo do idoso e de sua inclusão.
Sigamos os exemplos da milenaridade das culturas que respeitam e dedicam a seus idosos posição de destaque no tecido social; amemos os que se empenharam em construir o que somos. Continuemos. Juntos. Sem descartar ninguém. 

Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo)

19 junho 2014

A chave de nossas lembranças

Gosto de conversar com as pessoas. Gosto muito.
Preocupo-me com um tempo em que pessoas gastam parte significativa da vida com máquinas e se esquecem do significado de “gastar tempo” com outras pessoas. Olhos fitos no celular. Mensagens. Redes sociais. Jogos. Avidez pelo mundo virtual. E quase nenhuma palavra com quem está ao lado.
Gosto de conversar com as pessoas. Repito. E gosto de ouvir suas histórias. Momentos, partidas, encontros. Lágrimas de nossas dores. Paixão. Dores de um amor não correspondido. Cicatrização. E, de novo, a esperança. E, de novo, a dor. Temos a chave de nossas lembranças e o poder de revisitá-las. O tempo passa e permanece dentro de nós.
Lembro-me de minha infância, de minha pequena cidade e das famílias sentadas na calçada em dias quentes. Não havia ar-condicionado, não havia internet, a televisão não ocupava nosso tempo. A violência não nos frequentava. Na praça, sempre havia música. Íamos à missa e, na saída, conversávamos sem pressa.
Presentes? No natal e no aniversário. Hoje, os quartos dos filhos são repletos deles, sem nenhum valor afetivo. Têm todo tipo de computador. Mas há ausência de pais contadores de histórias, de conversas reais, de pessoas que “gastem tempo” com pessoas.
Se não compreendermos a importância da simplicidade na convivência cotidiana, as lembranças de nossos filhos estarão recheadas de jogos virtuais e de um mundo que, embora fascinante, não tem a essencialidade do contato real.
Não sou contra o avanço tecnológico e confesso ser admirador desse universo. Uso as mídias sociais para propagar minhas crenças e aprender com os amigos que frequentam meu "quintal tecnológico". Mas não abro mão do meu quintal real. De falar e ouvir.
Se os fogões a lenha, que faziam com que o preparo de nosso alimento desse um significado especial ao nosso tempo, não existem mais, existamos nós, presentes na vida e na lembrança futura dos nossos. Gosto de conversar com as pessoas.
Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo)